"The Anxious Generation" de Jonathan Haidt para Advogados
A advocacia, uma profissão marcada pela pressão e pelo conflito, enfrenta uma crise silenciosa de saúde mental. Em "A Geração Ansiosa", Jonathan Haidt expõe como a infância hiperconectada e superprotegida moldou profissionais com menos resiliência. Descubra como aplicar seus insights para mudar.
Em uma análise que transcende gerações e profissões, o psicólogo social Jonathan Haidt, em sua obra "The Anxious Generation" (lançada no Brasil como "A Geração Ansiosa"), oferece um diagnóstico contundente sobre a crise de saúde mental que assola os jovens. Embora o foco do livro seja a transição de uma infância baseada em brincadeiras para uma infância baseada em telas, suas conclusões ressoam profundamente no ambiente de alta pressão da advocacia. A profissão jurídica, por sua natureza, atrai e exige indivíduos resilientes, capazes de lidar com a adversidade e o conflito. No entanto, os escritórios de advocacia brasileiros estão cada vez mais preenchidos por uma nova geração de advogados que, segundo a tese de Haidt, foi privada das experiências fundamentais para o desenvolvimento dessa resiliência. Este post se propõe a adaptar os insights de Haidt para o universo jurídico, explorando como a "grande religação" da infância impacta a formação, a prática e o futuro da advocacia no Brasil.
Haidt argumenta que duas tendências nefastas convergiram para criar a "geração ansiosa". A primeira é a ascensão da "parentalidade superprotetora", que busca eliminar todos os riscos e desconfortos da vida de uma criança. A segunda é a imersão precoce e irrestrita em um mundo virtual de smartphones e redes sociais. O resultado, segundo ele, é uma geração que chega à vida adulta com menos experiência em resolver problemas de forma autônoma, menos habilidade para navegar interações sociais complexas e uma sensibilidade aguçada à crítica e ao fracasso. Para a advocacia, uma profissão que é, em essência, a gestão de conflitos e a resolução de problemas sob pressão, as implicações são imensas. O jovem advogado que não foi exposto a riscos calculados na infância pode hesitar em assumir um caso desafiador. Aquele que teve poucas interações sociais não supervisionadas pode ter dificuldades em uma negociação tensa ou em uma sustentação oral perante um tribunal. A aversão ao fracasso, cultivada em um ambiente que premia a perfeição, pode levar à paralisia diante da possibilidade de perder uma causa.
O livro de Haidt nos convida a refletir sobre a cultura dos escritórios de advocacia. A tradicional estrutura hierárquica e a mentalidade de "pagar o pedágio" podem ser particularmente danosas para essa nova geração. A pressão por longas horas de trabalho, a competição interna e a falta de um ambiente psicologicamente seguro podem exacerbar as vulnerabilidades que esses jovens profissionais já trazem consigo. O advogado sênior, forjado em uma era de maior autonomia e "casca grossa", pode ter dificuldade em compreender a necessidade de feedback constante, de um propósito claro e de um equilíbrio mais saudável entre vida pessoal e profissional que os advogados mais novos demandam. Não se trata de uma questão de "fraqueza" geracional, mas de uma incompatibilidade entre as expectativas e as necessidades de uma geração moldada por um contexto completamente diferente e as práticas de uma profissão que reluta em mudar.
A solução, tanto para a sociedade quanto para os escritórios de advocacia, não é simplesmente culpar a tecnologia ou os jovens, mas promover uma "religação" consciente. Haidt propõe quatro normas fundamentais que podem ser adaptadas para o ambiente jurídico. A primeira é "não dar smartphones antes do ensino médio", que, para os escritórios, se traduz em estabelecer limites claros para a conectividade. Isso significa criar uma cultura que não espera que os advogados estejam disponíveis 24/7, que respeita os fins de semana e as férias, e que incentiva a desconexão como forma de preservar a saúde mental e a criatividade. A segunda norma é "não ter redes sociais antes dos 16 anos", o que, no contexto profissional, significa treinar os advogados a lidar com a pressão da exposição online e a construir uma reputação digital saudável, focada em conteúdo de valor e não na busca por validação através de curtidas.
A terceira norma de Haidt é "escolas livres de celulares", o que para os escritórios pode ser interpretado como a criação de espaços e momentos para o trabalho focado e a colaboração presencial, livres da constante interrupção das notificações. Isso pode significar reuniões sem laptops e celulares, ou blocos de tempo dedicados ao trabalho profundo, sem interrupções. A quarta e talvez mais importante norma é "muito mais independência, brincadeira livre e responsabilidade no mundo real". Para a advocacia, isso se traduz em dar aos jovens advogados mais autonomia e responsabilidade desde o início da carreira. Em vez de mantê-los em tarefas repetitivas e de baixo valor por anos, os escritórios devem criar oportunidades para que eles assumam riscos calculados, lidem diretamente com clientes (com a devida supervisão), participem de negociações e desenvolvam suas próprias teses. É no "mundo real" do direito, com seus desafios e fracassos, que a verdadeira resiliência é forjada.
Em última análise, "A Geração Ansiosa" é um chamado à ação para os líderes de escritórios de advocacia. É um convite para que reconheçam que o bem-estar e a saúde mental de seus advogados não são apenas uma questão de responsabilidade social, mas um imperativo para a sustentabilidade do negócio. Um advogado ansioso, deprimido ou esgotado não consegue produzir seu melhor trabalho, não consegue inovar e, eventualmente, deixará a profissão. Ao adaptar os princípios de Haidt, os escritórios podem criar um ambiente que não apenas atrai, mas também retém e desenvolve os talentos da nova geração, transformando a ansiedade em resiliência, a superproteção em autonomia e a conectividade virtual em colaboração real e significativa. O futuro da advocacia depende da capacidade da profissão de se adaptar a essa nova realidade e de cuidar de seu capital mais valioso: as pessoas.