"Good to Great" de Jim Collins para Advogados
Descubra como transformar seu escritório de advocacia de bom para excelente. Aprenda os conceitos de Jim Collins, como a Liderança Nível 5, o Conceito do Porco-Espinho e a Cultura de Disciplina, e aplique-os para construir uma banca de advocacia com desempenho superior e duradouro no Brasil.
No panteão da literatura de gestão, poucas obras alcançaram o status icônico de "Good to Great" (publicado no Brasil como "Empresas Feitas para Vencer") de Jim Collins. Fruto de uma extensa pesquisa, o livro se debruça sobre uma questão fundamental: o que diferencia as empresas que apenas são boas daquelas que conseguem dar um salto para a excelência e sustentar esse desempenho ao longo do tempo? Embora o estudo original tenha focado em grandes corporações, seus princípios são atemporais e universais, oferecendo um roteiro poderoso para qualquer organização que aspire à grandeza. Para a advocacia, um setor tradicionalmente avesso a jargões de gestão, mas que enfrenta uma transformação sem precedentes, as lições de Collins são mais relevantes do que nunca. A missão deste post é traduzir esses conceitos para a realidade do advogado brasileiro, adaptando-os para a construção de escritórios de advocacia que não sejam apenas bons, mas verdadeiramente excelentes.
O primeiro e mais fundamental conceito apresentado por Collins é o da Liderança Nível 5. O autor descreve uma hierarquia de cinco níveis de liderança, culminando no líder de Nível 5, figura central em todas as empresas que fizeram a transição de boas para excelentes. Este líder combina uma humildade pessoal genuína com uma vontade profissional implacável. Ele é ambicioso, mas sua ambição é direcionada primeiro e acima de tudo para a instituição, não para si mesmo. No contexto jurídico, o líder Nível 5 não é o sócio-fundador carismático e midiático que centraliza todas as decisões e cujo ego se confunde com a identidade do escritório. Pelo contrário, é o sócio que, com modéstia, constrói o sucesso da banca a partir dos bastidores, que olha pela janela para atribuir o crédito à equipe quando os resultados são bons, e se olha no espelho para assumir a responsabilidade quando as coisas dão errado. Ele está determinado a construir um escritório que continue a prosperar mesmo depois de sua aposentadoria, focando em criar um legado duradouro em vez de um império pessoal.
Com a liderança adequada no comando, o passo seguinte é o princípio "Primeiro Quem, Depois o Quê". Collins usa a metáfora de um ônibus: os líderes excelentes primeiro se preocupam em colocar as pessoas certas nos lugares certos do ônibus (e tirar as pessoas erradas), para só então decidir para onde o ônibus vai. A sabedoria convencional sugere o contrário: primeiro defina a visão e a estratégia, depois encontre as pessoas para executá-la. Collins argumenta que, em um mundo em constante mudança, a estratégia precisará se adaptar, mas se você tiver as pessoas certas, elas terão a resiliência e a criatividade para encontrar o melhor caminho. Para um escritório de advocacia brasileiro, isso significa que o processo de contratação de sócios e associados é a decisão estratégica mais importante. É mais crucial ter uma equipe de advogados talentosos, disciplinados e alinhados com a cultura do escritório do que ter um plano de cinco anos perfeitamente desenhado. Um escritório com os advogados certos será capaz de se adaptar a uma mudança súbita na jurisprudência do STF ou a uma nova tecnologia disruptiva, enquanto um escritório com a equipe errada, mesmo com a melhor estratégia, irá fracassar.
Uma vez que a equipe certa está a bordo, é imperativo enfrentar a realidade nua e crua, sem nunca perder a fé. Este conceito, que Collins batizou de "Paradoxo de Stockdale", é a capacidade de aceitar os fatos mais brutais da sua realidade atual, ao mesmo tempo em que mantém uma fé inabalável de que você prevalecerá no final. O nome é uma homenagem a James Stockdale, um almirante americano que foi prisioneiro de guerra no Vietnã e sobreviveu mantendo essa dualidade. Para um escritório de advocacia, isso significa criar um ambiente onde a verdade seja ouvida. Significa analisar com honestidade por que um caso importante foi perdido, por que um cliente valioso deixou o escritório ou por que a rentabilidade está caindo, sem buscar desculpas ou culpados. É preciso liderar com perguntas, não com respostas, engajar-se em diálogos e debates, e conduzir "autópsias" sem culpa após cada erro. Ao mesmo tempo, a liderança deve manter a fé de que, ao enfrentar essas realidades, o escritório emergirá mais forte e encontrará o caminho para a excelência.
Enfrentar a realidade leva ao desenvolvimento do Conceito do Porco-Espinho. A partir de uma antiga parábola grega, Collins contrasta a raposa, que sabe muitas coisas e persegue vários objetivos, com o porco-espinho, que sabe uma única grande coisa: como se defender. As empresas excelentes são porcos-espinhos. Elas simplificam um mundo complexo em uma única ideia organizadora que guia todas as suas decisões. Esse conceito não é uma meta ou uma estratégia, mas um entendimento profundo que emerge da intersecção de três círculos:
- Aquilo pelo que você é profundamente apaixonado: Qual causa ou área do Direito incendeia a paixão da sua equipe?
- Aquilo em que você pode ser o melhor do mundo: De forma realista, em que tipo de serviço jurídico seu escritório tem o potencial de ser verdadeiramente superior a qualquer outro?
- Aquilo que move seu motor econômico: Qual é o indicador-chave que, se aprimorado, terá o maior impacto na saúde financeira sustentável do seu escritório (por exemplo, rentabilidade por caso, rentabilidade por hora faturável, ou valor vitalício do cliente)?
Para um escritório de advocacia, encontrar seu Conceito do Porco-Espinho é um processo de descoberta. Um escritório em São Paulo pode descobrir que, embora atue em várias áreas, sua paixão e excelência residem na estruturação de operações de fusões e aquisições para empresas de tecnologia, e que seu motor econômico é a taxa de sucesso em transações complexas. A partir desse entendimento, ele pode decidir abandonar áreas secundárias e focar todos os seus recursos para se tornar o melhor escritório do Brasil nesse nicho específico.
Com o Conceito do Porco-Espinho definido, o próximo passo é construir uma cultura de disciplina. Collins enfatiza que a disciplina, por si só, não é suficiente. É preciso uma combinação de pessoas disciplinadas, que dispensam a necessidade de microgerenciamento; pensamento disciplinado, que evita distrações e se mantém focado no Conceito do Porco-Espinho; e ação disciplinada. Isso cria um ciclo virtuoso. Uma cultura de disciplina não é sobre burocracia e controle, mas sobre criar um sistema onde pessoas autodisciplinadas tenham a liberdade e a responsabilidade para agir dentro de uma estrutura clara e consistente. Em um escritório de advocacia, isso significa ter advogados que não precisam ser lembrados de cumprir prazos, que pensam criticamente sobre como cada ação contribui para o sucesso do cliente e do escritório, e que executam suas tarefas com um padrão de excelência fanático, sempre alinhados com a estratégia central da banca.
Finalmente, Collins aborda o papel da tecnologia através do conceito de aceleradores tecnológicos. As empresas excelentes nunca adotam a tecnologia como um modismo ou por medo de ficarem para trás. Elas primeiro atingem o sucesso através da disciplina e do foco em seu Conceito do Porco-Espinho, e só então usam a tecnologia como um acelerador para esse sucesso já existente. A tecnologia, por si só, não pode tornar uma empresa excelente. Para um escritório de advocacia, isso é uma lição crucial na era das "legaltechs" e da inteligência artificial. A pergunta não deve ser "precisamos de um software de gestão?", mas sim "como um software de gestão pode acelerar nossa capacidade de sermos os melhores em contencioso tributário estratégico?". A tecnologia deve ser cuidadosamente selecionada para servir e potencializar o Conceito do Porco-Espinho, e não o contrário.
O caminho de bom para excelente, como descrito por Jim Collins, não é uma fórmula mágica, mas um processo longo e árduo de decisões disciplinadas e ações consistentes. Para o advogado brasileiro que deseja construir um escritório que transcenda a mediocridade e alcance um desempenho duradouro, os princípios de "Empresas Feitas para Vencer" oferecem um mapa claro. Começa com um líder humilde e determinado, que monta a equipe certa antes de definir o destino. Continua com a coragem de encarar a verdade, por mais dura que seja, e a sabedoria para encontrar a única coisa em que o escritório pode ser o melhor. E se consolida através de uma cultura de disciplina, onde a tecnologia serve como um acelerador, não como um motor. Construir um escritório de advocacia excelente é uma maratona, não uma corrida de 100 metros, mas os conceitos de Collins fornecem o plano de treinamento para chegar à linha de chegada e continuar correndo.